Vereadores
elegem quase metade dos conselheiros tutelares
Dezoito dos 40
conselheiros tutelares eleitos em Fortaleza tiveram a influência direta de
vereadores da Capital. Mais da metade deles tem ligação com partidos políticos,
segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral
As candidaturas para as vagas de
Conselho Tutelar acabaram sendo um ensaio para a disputa de uma das 43 vagas na
Câmara Municipal de FortalezaFoto: Helene Santos
Parlamentares na Câmara Municipal de Fortaleza
tiveram participação direta na eleição de pelo menos 18 conselheiros tutelares.
A influência fica mais clara quando números do Núcleo de Dados do Sistema
Verdes Mares apontam que, dos 40 novos conselheiros tutelares de Fortaleza, 26
são filiados a partidos políticos. Há quem exerça presidência partidária,
suplência de vereador e históricos de disputas eleitorais.
A influência política, no entanto, não se resume à
filiação. Nos bastidores, a eleição do Conselho Tutelar foi uma medição de
forças entre lideranças locais e revelou-se um termômetro do que está por vir
na eleição de vereador no próximo ano. Uma prévia da disputa das Eleições 2020.
Praticamente todos os conselheiros eleitos — e
também os suplentes — têm ligações com vereadores ou outras lideranças que
estão de olho em uma vaga na Câmara Municipal na próxima disputa. Nos
corredores da Câmara, comentam-se os nomes de parlamentares que conseguiram
eleger aliados e também aqueles que saíram derrotados do pleito.
As alianças políticas começam a ficar claras quando
se olha para o topo da tabela de votos. Os dois candidatos mais bem votados,
Irene Lima e Marcos Farias, são filiados ao Republicanos, ex-PRB, desde 2007,
segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ambos são liderados do ex-deputado federal Ronaldo
Martins e do vereador de Fortaleza Carlos Dutra, de quem Marcos Farias é chefe
de gabinete. Tanto Marcos como Irene têm fotos e outros registros públicos com
os líderes e em atividades na Igreja Universal do Reino de Deus.
Quarta colocada na lista, a conselheira eleita
Elvira Evangelista é esposa do vereador de Fortaleza, Emanuel Acrízio (PRP) e
filiada, desde 1995, ao PSB. Acrízio, em primeiro mandato parlamentar, começou
a atuação pública como conselheiro tutelar. A esposa obteve 2.527 votos na
disputa.
A lista que circula de mão em mão e nas pranchetas
dos vereadores aponta, pelo menos, 18 parlamentares como padrinhos de
candidatos eleitos ao Conselho Tutelar.
“É uma amostra de como vai se desenhar a eleição do ano que vem nos bairros.
Essa disputa existe há muito tempo e eu acho natural que vereadores queiram
participar”, diz um parlamentar que prefere não se identificar, mas que admite
ter conseguido eleger um aliado no domingo.
Outro vereador também admite ter apoiado candidato
no pleito, mas desafia: “Você não vai encontrar uma foto minha com ele em rede
social e nem em nada. Tudo dentro da lei”, sugere o parlamentar.
Além dos já citados, parlamentares que tiveram
aliados eleitos são Elpídio Nogueira (licenciado), Márcio Cruz, Mairton Felix
(elegeu o filho David Felix), Didi Mangueira, José Freire, Marcelo Lemos,
Carlos Mesquita, Dr. Porto, Bá, Dummar Ribeiro, Iraguassu Filho e Casimiro
Neto.
Apontado como um dos fortes pré-candidatos a
vereador na Capital no mundo da política, Lúcio Bruno, coordenador especial de
articulação política do prefeito Roberto Cláudio, teria ligações com, pelo
menos, cinco candidatos eleitos no Conselho.
À reportagem, Bruno admitiu que alguns conselheiros
eleitos são, sim, ligados à gestão municipal, mas que não diretamente a ele. O
secretário afirmou ainda que não participou de atos públicos em apoio a
qualquer candidatura no dia da eleição.
André Barbosa, servidor da Casa Civil do Governo
Camilo Santana também teria atuado na liderança de ao menos dois candidatos
eleitos nesta eleição para conselheiro.
Na lista, há também deputados estaduais, suplentes, ex-deputados e
ex-vereadores que ainda têm atuação política na Capital.
Esquerda
Se por um lado, há um notório crescimento na
influência religiosa na eleição, ligada à direita, por outro, observa-se
reservadamente, uma redução da presença de partidos de esquerda na Capital.
Com 15 candidatos no total, o Partido dos
Trabalhadores acabou elegendo apenas dois liderados na Capital. Um deles, no
entanto, não tem mais atividades internas na legenda. Caso semelhante ocorreu
com o PCdoB. Com vários candidatos, o partido acabou não tendo representante
eleito para o Conselho Tutelar, no domingo passado.
“Tivemos bons nomes que são militantes que foram candidatos. Mas pulverizou
demais”, disse o vereador do partido, Evaldo Lima. O Psol teve uma filiada
eleita neste ano.
Chamou atenção também dos observadores candidatos não eleitos. Vários
vereadores não conseguiram emplacar aliados. Um deles foi o atual presidente da
Câmara Municipal, vereador Antônio Henrique. Dois candidatos próximos a ele
ficaram na suplência das vagas.
Influências
As atuações políticas não pararam por aí. Há,
inclusive, presidente de partido na lista de eleitos. A nova conselheira
tutelar Eneylandia Rabelo é a atual presidente estadual do Partido da Mulher
Brasileira (PMB). Além dela, o partido reelegeu outra filiada, a ex-presidente
da sigla, Magda Costa, que, em 2016, ficou na suplência de vereador na Capital
cearense.
Chamou atenção
A influência política foi uma preocupação durante a
campanha para o Conselho Tutelar. O Ministério Público do Estado (MPCE)
divulgou diversas recomendações proibindo políticos de realizar propaganda de
candidatos em diferentes municípios do Estado para tentar garantir igualdade de
condições no pleito.
A lei n° 8.069/90, que regula o processo de escolha
dos conselheiros, proíbe que haja associações de candidatos a órgãos do
Governo, empresa pública, políticos municipais, estaduais ou federais, dentre
outros. Conforme o Ministério Público Estadual, se comprovadas denúncias de
infrações à regra, podem ser aplicadas sanções cíveis e administrativas aos
agentes públicos envolvidos.